Novos sabores expandem horizontes das plantações e abrem possibilidades mirando público diferenciado. Enquanto isso, de polo de pesquisa em São Roque vai sair o 1º vinho orgânico brasileiro
O negócio do vinho em São Paulo vive um novo momento graças às bebidas finas. Enquanto os consumidores agora podem experimentar sabores que até pouco tempo atrás eram encontrados apenas nas garrafas vindas do sul do Brasil ou do exterior, o setor se expande com novos investimentos. Tecnologia, conhecimento e cuidado estão fazendo a diferença.
“Nós temos um novo perfil surgindo. São produtores que vêm de outros segmentos da economia e que já têm o sonho de fazer o seu vinho. A gente observa que eles vêm com muito capital, têm uma ótima infraestrutura de maquinários, equipamentos de alto nível e também recursos humanos”, observa Adriana Verdi, assessora técnica da Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios (Apta), ligada à Secretaria de Agricultura de São Paulo.
Com isso, o desenho geográfico da produção de vinho também está mudando, com a produção se expandindo por regiões distantes das mais tradicionais, antes concentradas em São Roque e Jundiaí. Mesmo onde a temperatura é alta, como São José do Rio Preto ou Penápolis. “São regiões quentes, né? E estão provando que é possível sim a produção de bons vinhos. Isso até nos surpreende, porque nós como pesquisadores nem imaginávamos também que isso seria tão possível”, reconhece Adriana.
Ribeirão Branco, na região de Itapetininga, é um desses locais que “entrou no mapa”. O hotel luxuoso no meio de uma fazenda oferece uma experiência diferenciada ao turista, que aprecia a paisagem e pode visitar a plantação, vendo de perto cada cacho de uva.
“Nós vemos as plantas como se fossem um filho nosso que botamos na terra aqui. O cuidado com ela no dia a dia. Estamos no campo verificando se tem alguma coisinha que precisa fazer, se precisa colocar alguma coisinha a mais. É como um filho que você pôs ali e você tem que cuidar com carinho”, compara o engenheiro agrônomo e gerente da fazenda Ezequiel de Paula.
A vinícola tem o que há de mais moderno em equipamentos. Máquinas trazidas da Europa processam a uva e a bebida vai para as cinquenta barricas de carvalho compradas diretamente do produtor na França. Os vinhos tinto, branco, rosê e espumantes foram quase todos premiados em concursos internacionais. Todo o processo de produção do vinho é feito no complexo, do plantio da uva ao envase da bebida.
Nas caves, a temperatura é mantida em 16 graus durante o ano todo, o que mantém a qualidade da bebida dentro da garrafa. Dez mil garrafas de vários tipos de espumante feito com uvas plantadas e colhidas na fazenda ficam ali por 45 dias, de cabeça para baixo, de modo que a levedura da fermentação se acumule no gargalo. Isso não vai para a taça de forma nenhuma: é descartado após a garrafa ser congelada a -25ºC e a impureza se acumular em uma pedra de gelo do tamanho do gargalo. Feito isso, é só colocar a rolha e o lacre.
“O momento de São Paulo é de muito otimismo. Nós temos várias possibilidades de se fazer vinhos diferentes, com tipos de uvas e variedades diferentes, com qualidade excelente, mas para outro perfil. O viticultor paulista está aproveitando muito disso, está se organizando através de ações de marketing e organizações de indicações geográficas. Eu tenho certeza que todo consumidor, paulista e brasileiro, será beneficiado com esse futuro que estamos preparando”, diz o engenheiro agrônomo Murilo Albuquerque Regina.
🍇🌱 Vem aí o vinho orgânico
O setor de pesquisa também se beneficia do bom momento. Uma área de 44 hectares em São Roque é um importante campo para os especialistas que estudam as variedades de uva plantadas em muitas regiões do estado.
Desse grande laboratório para testes e novas descobertas pro plantio pode sair um novo paladar para o vinho paulista: o primeiro vinho orgânico de São Paulo. Só depois dos testes é que os produtores de uva terão segurança para plantar. E as últimas pesquisas estão priorizando as uvas para vinho fino, a nova aposta das vinícolas do interior.
“O que nós estamos olhando agora, para o futuro, é justamente a mudança das cultivares (designação dada a uma determinada forma de uma planta cultivada) e por isso nós retiramos a cobertura plástica deste vinhedo para fazer uma ou duas safras descobertas, e daí entrar com novos materiais, entre eles de uvas finas. Hoje nós temos um material híbrido aqui, que é a IAC Ribas, proveniente de cruzamento de uma syrah e uma seibel, que foi muito bem dentro do sistema agroecológico”, pontua Sebastião Tivelli, engenheiro agrônomo da Secretaria Estadual de Agricultura.
🍷💰 Novos negócios
Em São Roque, uma vinícola de 60 anos se transformou em um complexo turístico e explora novos negócios. A história da família é o orgulho de Alex, representante da quarta geração da família Moraes.
“Minha menina está cursando enologia, e isso é muito gratificante. Você fica com medo de ser quem vai ‘apagar a luz’, e quando ela encara isso, a gente fala: ‘opa, vamos continuar e ir para frente’”, diz, emocionado. “Tudo o que a gente sofreu lá atrás e viu acontecer, toda a evolução que tivemos, é gratificante”, emenda.
A plantação, com 1.150 pés de uva tempranillo, uma variedade espanhola que se desenvolve ano a ano, ocupa seis hectares. Mas os negócios da vinícola vão além disso. A estrutura instalada permite que a empresa faça vinho para quem não tem barricas ou tanques, nem o maquinário. A uva vai para São Roque e o vinho já pronto retorna dentro da garrafa.
“A gente consegue atrelar o nosso trabalho e a estrutura ao sonho desse cliente que tem um sitio ou fazenda onde produz a uva e aqui a gente tem todo o acompanhamento, onde vai ser feito todo o processo até de envelhecimento e depois o envase e rotulagem. Quando falamos em uma vinícola tudo é muito custoso e caro, e com esse tipo de serviço se tem uma questão mais saudável pelo modo da empresa, enquanto o cliente não precisa ter um investimento tão pesado em maquinário e pessoal”, complementa Alex.
“Já temos mais de 200 projetos de vitivinicultura e enoturismo dentro do estado. Isso mostra esse grande potencial e que os produtores estão de fato acreditando que esse investimento vai trazer retorno, vai engrandecer tanto o agronegócio paulista quanto também trazer uma nova opção para o seu cliente”, observa Ariana Sgarioni, presidente da Associação Paulista de Produtores de Uvas, Vinhos e Derivados (Vites Paulista).
“Eu vejo que essas vinícolas estão olhando para isso, estão enxergando essa mudança e estão sim se atualizando, buscando atender também esse cliente com vinhos, com outras variedades de uva, com vinhos elaborados, maturados em barricas de carvalho, vinhos premiados. Então, a gente está vendo sim essa mudança, inclusive nesses polos tradicionais”, finaliza.
Fonte: G1
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