Comportamento do consumidor e estudos de mercado reforçam a conexão direta entre baixas temperaturas e aumento de consumo
Na semana que oficialmente entramos no inverno, já tivemos amostras que a estação chega com algum vigor neste ano. O mercado do vinho agradece. Entre as máximas que habitam este universo existe a de que “o frio é o melhor vendedor de vinhos”.
Os argumentos para sustentar a tese são muitos, especialmente quando se pensa em tintos. O próprio aumento do consumo de vinhos brancos nos últimos anos é creditado ao clima, com invernos moderados, a gangorra ficou favorável aos vinhos brancos, espumantes e rosés.
Segundo pesquisa da Scanntech, em mais de 40.000 pontos de venda de vinhos, em agosto de 2023, mês típico de inverno, a venda de vinhos caiu 7,7% em relação ao ano anterior. A pesquisa relaciona a queda ao inverno ameno daquele ano, 1,4ºC acima da temperatura média (25,9ºC). A mesma pesquisa aponta que a categoria de vinhos apresenta dois picos de vendas durante o ano: um no período de inverno onde há um aumento no consumo de vinhos tintos e outro no final do ano, quando vinhos refrescantes como brancos, rosés, espumantes são mais procurados.
No tema comportamental, o clima mais frio pede uma bebida mais estruturada, não tão leve e fresca quanto uma cerveja “trincando”, mas não tão “turbinada” quanto um destilado. Ninguém quer segurar um copo com uma cerveja estupidamente gelada em uma noite congelante, e ao mesmo tempo, não queremos “queimar a largada” bebendo um whisky cowboy antes da refeição. O vinho se coloca nesta zona de conforto, que consegue aquecer o corpo de forma gradual, com algum controle. Ponto extra para o tinto por não precisar climatizar a bebida para ser servido em um dia frio (uma das raras vezes que a recomendação de servir em temperatura ambiente funciona no Brasil).
Além do teor alcoólico intermediário se comparado às duas outras bebidas, o vinho acompanha com excelência os pratos que costumamos comer no inverno. E aqui a verdadeira vocação dos vinhos: a mesa. Assados, ragus, massas, polentas… fácil notar que proteínas e gorduras aparecem com maior frequência e isto pede taninos, estrutura e concentração de sabor dos tintos. Embora brancos barricados também encarem com desenvoltura o desafio de acompanhar queijos e pratos que levem boa porção de creme de leite e manteiga.
E também continua valendo a dica da harmonização regional. Pesquise a origem do prato e escolha um vinho com um perfil semelhante ao daquela região de origem. Alguns exemplos deste salivante exercício: parrilas encontram seus pares em malbecs, tannats ou cabernets (seja sauvignon ou franc) sul-americanos; zinfandel (ou primitivo) combina com carnes besuntadas em molho barbecue; massas ou polentas com ragus com carne suína, bovina e pato pedem pela acidez e taninos da sangiovese – podendo ir em ordem crescente de intensidade de acordo com a ordem das carnes – um Chianti, um Rosso ou Brunello di Montalcino e um Supertoscano. Carnes cozidas com um toque de vinho, no estilo bourguignon, serão valorizados pela companhia de um pinot noir. E aqui sem purismos, não é necessário um Cru de Gevrey-Chambertin em seu momento de maturidade para ser feliz. Um pinot noir da costa chilena ou das partes mais altas de Uco é uma ótima solução. Os nossos vaca atolada, rabada e virado mineiro funcionam bem ao lado tintos brasileiros como tannat e marselan da Campanha Gaúcha ou merlot do Vale dos Vinhedos.
Pesquisa de Martin Hirche, Juliane Haensch e Larry Lockshin – Comparing the day temperature and holiday effects on retail sales of alcoholic beverages – a time-series analysis (2021)
E se faltava um dado definitivo, o gráfico acima mostra as vendas no canal off-trade (supermercados) no mercado norte-americano entre 2013 e 2015, relacionando às temperaturas médias semanais. Impossível não notar a relação inversamente proporcional entre as temperaturas e o consumo de tintos.
Fonte: Artigo de Marcel Miwa / Guia dos Vinhos / Estadão
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